O mundo real do Coronel Nascimento

As histórias verdadeiras de como as milícias dominaram os morros do Rio de Janeiro e as estratégias para combatê-las são o tema central do aguardado “Tropa de elite 2”

MARTHA MENDONÇA E NELITO FERNANDES
PROMOVIDO
O ator Wagner Moura em cena de Tropa de elite 2

Ele passa de capitão a coronel e é com essa patente que combate as milícias
O fenômeno Tropa de elite está de volta aos cinemas e às livrarias. Só não está de volta às bancas de camelôs, onde o DVD pirata do filme estreou há três anos, antes do lançamento oficial do filme. Para impedir que a pirataria afaste parte dos potenciais espectadores da continuação do longa-metragem, sua produção tentou blindá-lo ao máximo. Com isso, o retorno do Capitão Nascimento às telas em Tropa de elite 2, na sexta-feira, mais parece uma operação policial cercada de sigilo. No mesmo dia, o livro Elite da tropa 2 (editora Nova Fronteira, 304 páginas,



R$ 39,50) chega às prateleiras com a disposição de  repetir o êxito da obra que o precedeu – até a inversão das palavras “tropa” e “elite” é a mesma do original. Desta vez, livro e filme miram as milícias, os grupos criminosos formados por policiais e políticos corruptos que dominaram as favelas cariocas ao tomar à força o controle que antes pertencia aos traficantes.
Embora sejam apresentados como obras de ficção, tanto o livro quanto o filme se inspiram em pessoas e histórias da vida real. Caminham lado a lado ao denunciar as engrenagens de uma indústria da violência. “A milícia coloca o policial como protagonista do crime. É o maior problema da segurança no Rio de Janeiro, hoje”, diz Luiz Eduardo Soares, um dos quatro autores do livro.

 O cineasta José Padilha já tentou explicar a violência urbana de várias formas. No documentário Ônibus 174 (de 2002), ele adotou a ótica do miserável que se transforma em bandido. Depois, em Tropa de elite, voltou ao tema pelo ângulo do policial honesto. Agora, avança para a política. Dissecando os interesses que determinam as estratégias de segurança pública, Padilha tenta mostrar como as milícias se formaram e conquistaram poder. Ex-estudante de física, o diretor costuma dizer que faz cinema como quem faz ciência: pega um determinado fenômeno da natureza e tenta reproduzi-lo para explicar suas relações de causalidade.
“Por que os números da violência urbana aqui são maiores do que os do resto do mundo?”, diz Padilha. “A resposta da esquerda tem sido sempre a questão social: onde há miséria, há violência. Já para a direita, é uma questão de falta de repressão. Mas os fatos refutam esses dois lados como motivos isolados. Para mim, é na administração pública que está a principal explicação. O Estado é mais parte do problema do que da solução”, afirma. Se Tropa de elite apresentou ao grande público as entranhas da corrupção policial, sua sequência mostra, com o mesmo didatismo cinematográfico, o alinhamento de policiais e políticos corruptos em organizações criminosas.

“O Estado converte miséria em violência. Ele transforma os pequenos criminosos em monstros e empurra os policiais para a corrupção”
JOSÉ PADILHA, cineasta 
As primeiras cenas do filme mostram uma grande operação do Batalhão de Operações Policiais Especiais, o Bope, contra traficantes no Morro Santa Marta, no Rio de Janeiro. Na trama, essa elite da polícia no Estado consegue livrar boa parte dos morros do tráfico de drogas – até então o grande inimigo. Depois de transformar o Bope em uma máquina de guerra, com helicópteros e blindados, seu comandante, o Capitão Nascimento, é alçado ao posto de subsecretário de Inteligência do Estado. Há, então, uma passagem de tempo no filme. Já de cabelos grisalhos e ocupando um cargo ligado ao comando da segurança e à política, Nascimento conhecerá seus novos inimigos. Vencida a batalha contra os traficantes, o protagonista terá de enfrentar o sistema. “O espectador vai descobrindo o jogo político junto com Nascimento”, diz o ator Wagner Moura, que vive o personagem. “Ele, um servidor público dedicado a uma causa durante toda a vida, se vê como peça de um tabuleiro de interesses nada corretos.”
O livro Elite da tropa 2 também explica como as milícias agem. Em relação à obra de 2007, mudaram os bandidos (antes eram os traficantes) e também os s “mocinhos”. Agora eles são da Delegacia de Repressão ao Crime Organizado (Draco). Escrita a oito mãos, pelo antropólogo Luiz Eduardo Soares, pelo delegado da Draco Cláudio Ferraz, pelo policial militar André Batista e pelo ex-capitão do Bope Rodrigo Pimentel (principal inspiração do Capitão Nascimento), a história é narrada por um inspetor da Polícia Civil fictício, personagem que é a mistura de vários policiais da Draco. A narrativa alterna relatos chocantes da violência dos milicianos e análises aprofundadas das raízes do crime no Rio. Na avaliação dos autores, a formação das milícias nasce da cultura do segundo emprego do policial. Embora seja ilegal, o “bico” é tolerado pelo Estado. Ao permitir a prática, o governo ameniza as pressões por aumentos salariais, mesmo pagando abaixo da média nacional. “É uma espécie de ‘gato’ orçamentário”, diz Soares.
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