A Era das telas e da divergência

por Pedro Cabral
Pare um minuto e calcule: quanto tempo você passa diante das telas durante o dia? Que telas? Toda e qualquer tela: celular, computador, laptop, televisão, palmtop, caixa eletrônico, painéis eletrônicos, relógios, tocadores de mp3, cinema e por aí vai... São telas pequenas e grandes, móveis - você até carrega no bolso -, que você tem em casa, no trabalho, ou simplesmente vê na rua ou no embarque do aeroporto. Certamente você vai chegar ao número de 16, 17, até 18 horas ou mais em frente às telas. Certo? Se você chegou a este número ou algo próximo disso, acabo de informar que você é um teleinterativo. Provavelmente muitos questionarão: mas não seria telespectador? Não, você não é um telespectador. Você tem uma postura ativa diante das telas. Você interage com as telas. Portanto, você é um teleinterativo. Antes de prosseguir, peço licença à Língua Portuguesa para usar o prefixo tele, não para designar televisão ou distância, seus usos mais comuns, mas para falar sobre aquele que está em frente às telas. Voltando ao raciocínio... o movimento crescente de usuários que interagem com as telas ainda caminha a passos lentos. Tanto acadêmicos quanto profissionais de marketing ainda engatinham nas teorias da interatividade aplicada às telas. Mas os usuários, ah, os usuários, esses sim demonstram uma maturidade tecnológica refletida na intimidade com as tão diversas e essenciais telas que fazem com que novas categorias e mercados surjam a todo tempo. As telas da sua conveniência.
E já que estamos falando em telas e de que forma as marcas têm aproveitado seus potenciais, quero citar aqui mais um termo que acho simples, inteligente, mas não tão óbvio: divergência. Sim, todas essas telas surgem a partir da divergência. Mas Pedro, não seria convergência?? Não!! Segundo AL Ries e sua filha Laura Ries, no livro publicado recentemente no Brasil A Origem das Marcas (M.Books), tanto produtos como marcas vencedoras são divergências de categorias já existentes, num processo semelhante ao descrito por Darwin na teoria da evolução das espécies . A TV não vai desaparecer e se fundir com o computador, assim como o despertador e o relógio não desapareceram com o surgimento do rádio-relógio. Cada um atende a uma necessidade específica. Existe eventualmente uma conveniência específica para o consumidor de juntar alguns tipos de aparelhos como celular e câmera. Sendo, assim, cada tela surge não com o objetivo de substituir a outra. Mas, sim, para atender uma necessidade do consumidor que ainda não foi explorada por uma categoria já existente. E essas telas todas não são a mera evolução da tela do cinema, mas divergências que criaram novas categorias de produtos e serviços, assim como o homem não é um upgrade do macaco. Da divergência que surgem novas categorias. É aí que surgem as marcas vencedoras.
Diante de tantos novos conceitos – afinal, alguém precisa dar nomes ao que está acontecendo – defendo que as marcas precisam entender que há uma ruptura na teoria da cultura de massa, da sociedade e da mídia de massa. O marketing de massa é um passado com inércia. Ele ainda vai funcionar por um bom tempo, enquanto uma sociedade muito desigual como a do Brasil chamar de massa as pessoas mais pobres, aqueles que têm como opção apenas uma tela! O consumidor gosta de opções e gosta de escolher. Da postura ativa. É a postura do teleinterativo. Sim, porque até quem só assiste TV aberta hoje em dia pode escolher quem vence o BigBrotherBrasil. E o mais curioso: as maiores audiências da TV aberta têm alguma coisa relacionada com a interatividade que não é a característica natural do meio.
Os teleinterativos podem comprar pela Internet, baixar músicas no tocador de mp3 e dizer até “porque estou correndo”. Em recente campanha da Nike, competidores de uma prova escrevem nas camisetas o porquê de participar da corrida. Enviam mensagem pelo celular que são transmitidas pelo telão nas ruas. E exercem o pleno direito de interagir com as telas. Ah, essas telas. Os usuários nem percebem o quanto estão vivendo com elas. Aliás, se aproveitam cada dia mais da forma de interação que elas permitem.
Já imaginou montar uma geladeira, nos moldes do “monte seu carro” utilizado pela indústria automobilística? A Brastemp saiu na frente e lançou o Brastemp You, site por meio do qual o usuário pode “montar” o seu refrigerador e receber em casa tão qual sempre sonhou. Viva a mass costumization, característica perceptível na era dos teleinterativos, na era da divergência. Só pra reforçar a teoria: a geladeira que você compra na loja não deixa de existir. A geladeira customizada surgiu para afirmar a personalidade da marca diante da força de um varejo que trabalha a favor da inércia da massificação.
E as marcas, de modo geral, têm essa consciência? Algumas sim. E têm explorado muito bem isso. São marcas que estão aprendendo a fazer parte da vida das pessoas no momento certo, com sensibilidade para criar emoção e empatia, com o discernimento de ser útil.
Matéria publicada no jornal Meio & Mensagem no dia 14 de novembro de 2005
artigo publicado em: Jornal Meio & Mensagem

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